domingo, 10 de março de 2013

Casamento

Eu sempre fico pensando sobre os efeitos do tempo nos relacionamentos longos, especificamente nos casamentos.
Início de envolvimento é tão bom! Os primeiros olhares, os  primeiros toques, o frio na barriga, o medo de desagradar. Enfim, toda novidade contida.
Com o passar dos anos é certo que essas coisas sejam perdidas, mas ganha-se muito também como intimidade e cumplicidade. 
E o que é que mantém aceso o amor? Sabemos que eterno é aquilo que se renova todos os dias.
Outro dia, durante a aula de Estudos línguisticos e literários na faculdade, nos foi dado um poema da grande Adélia Prado e que trouxe várias respostas para mim, além de  me envolver com a intensidade do amor da noiva que resgata suas primeiras sensações com seu amado. 
Quando eu me projeto neste poema, acalmo o meu coração que  tanto espera pelo noivo e guarda a sabedoria existente na história desta noiva que não é submissa a seu homem, mas que se rende por inteira ao amor.



Casamento
 Adélia Prado

Há mulheres que dizem:
Meu marido, se quiser pescar, pesque,
mas que limpe os peixes.
Eu não. A qualquer hora da noite me levanto,
ajudo a escamar, abrir, retalhar e salgar.
É tão bom, só a gente sozinhos na cozinha,
de vez em quando os cotovelos se esbarram,
ele fala coisas como "este foi difícil"
"prateou no ar dando rabanadas"
e faz o gesto com a mão.
O silêncio de quando nos vimos a primeira vez
atravessa a cozinha como um rio profundo.
Por fim, os peixes na travessa,
vamos dormir.
Coisas prateadas espocam:
somos noivo e noiva.



Texto extraído do livro "Adélia Prado - Poesia Reunida", Ed. Siciliano - São Paulo, 1991, pág. 252.
Saiba mais sobre Adélia Prado e sua obra em "Biografias".

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